"E viveram felizes para sempre."
É assim que todos os contos de fadas que nós conhecemos terminam mas será que sempre foi assim? A resposta é NÃO, não foi sempre assim. Na verdade as primeiras versões dos actuais contos de fadas não eram assim tão encantadas. Na realidade essas histórias foram criadas para entreter os adultos e não para ler para as crianças antes de dormir (digo-vos já que se assim fosse as pobres crianças iam ter muitos pesadelos) porque essas histórias nem sempre eram bonitinhas e nem sempre tinham um final feliz. Aliás quase nunca!
Vamos começar com uma das mais levezinhas...
A Bela e o Monstro
Esta mudou relativamente pouco (pelo menos em comparação com outras). Na versão original não haviam objectos falantes nem sequer um homem a achar-se o melhor e que quer casar com a Bela, e o Monstro faz lembrar uma cobra. Mas vamos então à história...
Nesta história o mercador tem outras duas filhas interesseiras e três filhos, além de Bela (é claro). O pai de Bela parte numa viagem e diferente dos outros irmãos Bela não pede riquezas como presentes mas sim uma simples rosa vermelha. No meio do caminho o mercador encontra um antigo castelo com comida e uma lareira para se aquecer. Mas antes de ir embora ele rouba uma rosa para levar à sua filha. Então o Monstro aparece, fica furioso e diz que só o perdoa pelo roubo se ele lhe trouxer uma das suas filhas. Como a Bela se sente culpada então ela vai para o castelo do Monstro. Depois disso é o mesmo todos os dias... O Monstro pede Bela em casamento e ela recusa sempre. Um dia Bela pede para ir visitar o pai e o Monstro aceita com a condição de que ela volte dentro de dois meses ou então ele morreria. Numa noite Bela sonha com o Monstro a morrer e então volta para o Castelo. Quando lá chega o Monstro estava realmente a morrer mas antes que isso aconteça pede-a novamente em casamento. Bem, a Bela deve ter pensado "ah e tal é melhor deixa-lo morrer feliz, então vou aceitar" e por isso ela diz-lhe que sim, que se casaria com ele. E para sua surpresa o Monstro transforma-se num lindo príncipe e eles casam.
Esta teve um final feliz mas será que a próxima terá?!
Branca de Neve
Na versão original a madrasta má é na verdade a verdadeira mãe da Branca de Neve, que tem apenas 7 anos. A mãe vendo que está a ficar uma velha carcanha e a filha uma linda menina ordena a um homem (talvez o caçador) que mate a Branca de Neve e lhe leve não só o coração como também o fígado, os rins e os pulmões. E isto tudo para quê?! Para comer ao jantar (eca!!!). Mas tal como na versão que conhecemos o carcereiro deixa a pobre menina fugiu para a floresta e então ela encontra a casinha dos 7 anões. Nada de muito estranho até aqui, mas a história ainda não acabou. Pensem lá bem, 7 homenzinhos sozinhos numa floresta e agora aparece uma menininha do mesmo tamanho deles... Pois não é preciso dizer muito mais. Mas continuando... A mãe descobre que ela afinal está viva e vai a casa dos anões e faz a Braca de Neve comer a maça envenenada. E ela come e morre. Isso mesmo, ela morre! Mas depois é encontrada pelo príncipe (não muito encantado a princípio porque um príncipe encantado não leve criancinhas mortas para o seu castelo). O que se segue é que o criado encarregue de cuidar da defunta já farto desse trabalho dá um soco na barriga da Branca de Neve e ela cospe o bocado da maça envenenada que tinha comido e volta à vida (hã?!). Depois ela (ainda com 7 anos lembrem-se) casa-se com o príncipe que a salvou (acho que nem ele percebeu porque ficou com os louros da ressurreição). Mas como em quase todos os contos de fadas a má da fita não se pode safar e este não foi excepção. A mãe malvada foi forçada a dançar até à morte com sapatos de ferro em brasa.
E agora falando em príncipes muito pouco encantados...
A Bela Adormecida
Esta história difere bastante da que nós estamos acostumados a ouvir. Começa com a Bela Adormecida destinada a cumprir uma profecia (sim, ela não foi amaldiçoada por nenhuma bruxa má). Ela espeta uma farpa mágica debaixo da unha e fica adormecida. Depois de muito tempo um príncipe (lembrem-se que não é encantado) encontra-a e depois de tentar acorda-la sem êxito decide aproveitar-se da pobre moça adormecida (é isso mesmo que estão a pensar, o mesmo que acontece com a Branca de Neve). Como ele não era idiota nem nada, o príncipe volta mais e mais vezes. Como se apenas estar a dormir sem poder acordar e ser violada por um príncipe pervertido é pouco, a pobre Bela Adormecida engravida de gémeos (não podia ser só um, tinham logo de ser dois). Não se sabe exactamente como é que ela e os bebés sobrevivem e muito menos como acontece o parto (já que ela continua a dormi) mas um dia um dos bebés confunde o dedo da mãe com o seu peito e, por uma sorte incrível era o dedo onde a farpa estava espetada, então ele ao chupar o dedo a farpa sai de lá (mas o bebé não morre) e a Bela Adormecida acorda sem fazer a mínima ideia do que lhe aconteceu. Um dia o príncipe volta (sabe-se lá para quê, né?) e encontra a moça acordada. Então ele decide casar-se com ela (ao menos isso) e ela aceita (acho que sem muitas opções). Mas ao chegar à sua nova casa descobre que a sua futura sogra é um ogre (literalmente). E depois é tudo muito lógico. A sogra faz o que todo o ogre faria e tenta comer os netos mas então o príncipe (dá uma de encantado) e mata a mãe. E depois os sobreviventes viveram felizes para sempre (menos mal).
Mas agora falando em jantar crianças...
Capuchinho Vermelho
O início da história é basicamente igual à que todos conhecem. A Capuchinho é enganada pelo lobo e chega tarde demais a casa da avozinha mas uma vez lá tudo muda... Ela descobre que o lobo fez um ensopada com a velhinha (literalmente com a velhinha lá dentro) e para piorar a situação obriga a Capuchinho a comer do ensopado. E ela sabe que será a sobremesa. Então não tem mais nada, faz um strip-tease para o lobo para tentar distraí-lo e conseguir fugir. Mas o plano não corre como o esperado e a Capuchinho acaba mesmo por ser a sobremesa (porque nesta versão não há nenhum caçador para a salvar). Não há final feliz aqui. Quer dizer... até há se formos ver pelo ponto de vista do lobo que encheu a barriga e ainda teve direito a um showzinho.
E falando em finais infelizes para a protagonista...
A Pequena Sereia
Na primeira versão desta história a Pequena Sereia só tem duas irmãs e ao completar 15 anos é-lhe permitido ir até à superfície do mar. E então já sabem o que acontece... Ela apaixona-se por um príncipe que está num navio e salva-lhe a vida quando o navio se afunda. Então, depois desse incidente a Pequena Sereia, perdidamente apaixonada pelo príncipe, vai até à Bruxa do Mar e pede-lhe para ser humana. E a Bruxa lá lhe dá o que ela deseja mas com algumas condições. A Pequena Sereia ficaria muda e a cada passo que desse sentiria como se estivesse a andar sobre facas. Mas o pior é que se ela não conseguisse casar-se com o príncipe ela iria virar espuma do mar e morreria. E com tudo isto uma pessoa começa a pensar, não pode correr nada pior. Mas é claro que pode, e corre. Então depois de tudo isto a Pequena Sereia descobre que o príncipe já tinha uma prometida (que por sinal não era uma miúda muda e que foi "peixe" a vida toda). Então as irmãs da Pequena Sereia tentam ajudar e vão até à Bruxa do Mar que lhes dá a solução para o problema da Pequena Sereia: ela deveria cravar uma faca no coração do príncipe e tudo voltaria ao normal (para ela não para o príncipe claro). Mas na hora H a Pequena Sereia decide que ser espuma do mar não seria assim tão mau e por isso não mata o príncipe, virando espuma e desaparecendo no mar.
Voltando agora ao Lobo Mau...
Os Três Porquinhos
Esta versão da história é muito mais rápida do que a que conhecemos porque estes porquinhos não são exibicionistas e não andam para aí a gabar-se das suas lindas casinhas. O lobo chega e come o primeiro porquinho. Depois vai e come o segundo porquinho. Como é esperado o terceiro porquinho é mais difícil. Então o lobo tenta fazê-lo sair de casa mas o porquinho não cai na conversa. Sem outra opção, o lobo (armado Pai Natal) tenta entrar pela chaminé. Ora mas este porquinho é inteligente e põe um caldeirão com água a ferver debaixo da chaminé, onde o lobo cai. como se não bastante, o porquinho, ainda não satisfeito, come o lobo (não sabia que porcos comiam ensopado de lobo).
E agora a última...
Cinderela
No original não existe Fada Madrinha mas sim uma árvore plantada em cima da campa da mãe da Cinderela (uma espécie de "árvore madrinha"). E não é apenas realizado um baile mas sim três. Então, o início da história todos conhecem. O pai da Cinderela casa com uma mulher malvada com duas filhas insuportáveis que tratam Cinderela como uma criada e blá bla blá chega a hora do baile, ou melhor, do primeiro baile. Nesse baile a Cinderela fica a chuchar no dedo, quer dizer a separar lentilhas, até que dois passarinhos aparecem para a ajudar. No dia do segundo baile, Cinderela fica novamente em casa, desta vez a separar sementes, até que os passarinhos aparecem novamente para a ajudar. Quando terminam, os passarinhos dizem à Cinderela para ir ao túmulo da mãe e sacudir a árvore. Quando o fez ganhou um lindo vestido prateado para ir ao baile mas com a condição de voltar antes da meia-noite (novidade). Assim que dançou com ela o príncipe percebe que ela seria a sua esposa (também não é novidade). Quando chega a hora a Cinderela vai embora. Na noite seguinte acontece o terceiro baile. Ela fica novamente em casa, desta vez a separar ervilhas e novamente os passarinhos voltam para a ajudar. Mais uma vez depois do trabalho feito ela vai até ao túmulo da mãe e sacode a árvore ganhando um vestido dourado com sapatinhos de ouro. Nessa noite o príncipe já esperava por ela, fazendo-lhe muitas perguntas. Desta vez a Cinderela perde a hora e já se sabe o que acontece, corre e perde o sapatinho. O príncipe não tendo mais pistas a não ser o sapatinho disse que se casaria com a mulher a quem o sapatinho servisse. Quando chegou a casa de Cinderela as primeiras a experimentar foram as duas irmãs. A mãe delas avisou-as que se o sapatinho não lhes servisse teriam de usar uma faca e cortar a parte excedente dos pés. A irmã mais velha experimentou e como o sapatinho não lhe serviu cortou o calcanhar. O príncipe já estava a leva-la para o castelo quando os passarinhos cantaram avisando o príncipe do sangue. Então ele levou a impostora de volta para casa. A outra irmã experimentou e como também não serviu cortou os dedos para servir. Novamente o príncipe já estava a leva-la para o castelo quando novamente os passarinhos avisaram o príncipe do sangue (este príncipe deve ser cego para não as ver a usar uma faca e mutilarem-se mas pronto...). O príncipe voltou para a casa de Cinderela e perguntou se havia outra rapariga ali. Mesmo a madrasta não querendo o príncipe mandou chamar Cinderela. O sapatinho serviu (como e óbvio) e o príncipe reconheceu a sua noiva (note-se que ele só a reconhece por causa do sapatinho). Eles vão casar e quando as irmãs vão para ver o casamento os passarinhos (agora não muito bons) picam os olhos delas deixando-as cegas (como se já não bastassem tarem mancas).
Existe ainda outra versão mais antiga desta história. Nela,Cinderela é filha de um rei viúvo que sonhava casar com uma mulher com pés perfeitos como os da sua falecida esposa. O problema é que a única a cumprir essa exigência era a sua própria filha. Para não ter que casar com o pai, Cinderela foge dentro de um armário (deve ter ido para Nárnia, não?) e vai morar com uma ex-mulher do seu pai e as suas meias-irmãs. E depois começa a história que está em cima...
Pronto! E com tudo isto eu continuo a preferir os contos de fadas da Disney :)